O Auditório da Casa das Histórias Paula Rego foi palco, no dia 17 de abril, do seminário “Um Olhar sobre a Violência Doméstica na Infância e Juventude”. Esta ação, promovida pela Comissão de Proteção de Crianças e Jovens de Cascais (CPCJC), está integrada nas iniciativas do Mês da Prevenção dos Maus-Tratos na Infância.
O seminário teve como foco as crianças e jovens expostas, ou vítimas, de violência doméstica nomeadamente o impacto no seu desenvolvimento e no acesso à justiça.
Este evento contou com participação de autarcas, profissionais, magistrados, forças de segurança e académicos que partilharam conhecimentos, reflexões, experiências, inquietações e desafios na área da prevenção e atuação em situações de maus-tratos na infância e juventude.
Maria João Fernandes, vice-presidente da Comissão Nacional de Promoção dos Direitos e Proteção das Crianças e Jovens (CNPDPCJ), considerou Cascais um bom exemplo na área da violência doméstica face à sua rede de intervenção que está em constante melhoria. Afirmou que “as crianças são o nosso maior bem e dado que elas crescem pelo exemplo, temos que criar bons exemplos em casa. A prevenção começa em casa”. Recordou que no mês de abril muitos municípios iluminam-se da cor azul em lembrança da avó americana Bonnie W. Finney, que em 1989, nos Estados Unidos, tomou a iniciativa de colocar uma fita azul na antena do seu carro, de modo a demonstrar a sua dor face aos acontecimentos trágicos de que tinham sido vítimas os seus netos.
O Presidente da Câmara Municipal de Cascais, Carlos Carreiras, realçou o papel fundamental que a CPCJC faz um na proteção das crianças cascalenses e anunciou que, brevemente, vai dispor de um novo espaço físico situado junto à Estação da CP na Parede. Disse que a comunidade escolar e os profissionais de saúde têm que estar atentos no sentido de identificarem e alertarem as situações de violência doméstica. Acrescentou, também, que “existe um forte empenho por parte do município nesta área, temos que estar mais próximos, mais confiantes a fim de termos a capacidade de reduzir o risco e de dar voz às crianças e jovens pois elas têm o direito de serem protegidos por todos nós”.
Sandra Tavares, Presidente da CPCJ de Cascais apresentou alguns dados relativos a 2022. Começou por destacar que desde 2020 tem-se assistido a um aumento de 100 processos por ano e que no ano transato foram sinalizados 927 novos casos de crianças e jovens em perigo no concelho. Confessou que “estes números deixam a Comissão bastante apreensiva dado que a equipa da CPCJ é constituída somente por oito pessoas e torna-se muito difícil gerir tantos processos”. De acordo com o plano de intervenção junto das famílias, em 2022, a CPCJ retirou 22 crianças aos progenitores visando afastar o perigo em que elas se encontravam e garantir a sua recuperação física. Mencionou, ainda, que foram arquivados 290 processos, representando assim o mesmo número de crianças fora de perigo.
A Procuradora Dulce Rocha, Presidente do Instituto de Apoio à Criança, partilhou um pouco da sua experiência. Contou que uma criança exposta às situações de violência doméstica sofre imenso, nomeadamente que “não tem um sono tranquilo, está à espera que aconteça sempre algo à mãe, vai cansada para a escola”. Referiu alguns estudos que comprovam que estas crianças têm baixo auto-estima e ficam mais vulneráveis às doenças. Afirmou que a sociedade não se pode conformar com esta situação, e que, todos juntos, temos que criar mecanismos de prevenção.
Coube ao Vereador Frederico Pinho de Almeida apresentar o Fórum Municipal de Cascais contra a Violência Doméstica que agradeceu às 43 entidades que fazem parte do FMCVD pelo difícil mas extraordinário trabalho realizado e deu os parabéns à equipa da CPCJC pela iniciativa e por continuar a trabalhar diariamente na defesa das crianças e jovens. Destacou os marcos significativos desde a criação do Fórum em 2003 até à implementação da Casa Pilar em 2022 e salientou o trabalho desenvolvido traduzido nas 25 vítimas acolhidas (no apartamento de transição), os 770 alunos por abrangidos pelo projeto PreVio, os 428 profissionais que participaram na Formação Rede Segura, as 390 vítimas acompanhadas em 2021 (SAV) entre outros. Enalteceu o Plano Estratégico do FMCVD 2023-2025, que esteve em participação pública durante o mês de março, enfatizando que o mesmo tem como objetivos estratégicos: consolidar e alargar respostas, qualificar e melhorar a intervenção em rede, prevenir a violência doméstica e melhorar o conhecimento e a comunicação.
A Professora Madalena Alarcão, da Universidade de Coimbra, explanou o efeito da violência doméstica no desenvolvimento emocional, cognitivo e físico das crianças e jovens, as formas de violência doméstica, o comportamento violento, os atores da violência, a consequência do maltrato infantil, entre outros.
Elsa Figueiredo, do Espaço V, apontou que “as crianças são usadas como forma de perpetuar a violência e que as mulheres têm muito receio de ficarem sem os filhos” e assegurou que o rompimento com a situação de violência por parte das vítimas, o perspetivar o futuro sem o agressor é difícil. Ressalvou que a violência, por vezes, não termina com o final da relação entre os progenitores sendo as crianças peões nestas situações e que elas são as principais vítimas que os técnicos têm que defender. Frisou ainda que, entre outros efeitos, as situações de violência doméstica provocam nas crianças ansiedade, depressão, decréscimo do rendimento escolar sendo o papel das escolas fundamental. Nesse sentido referiu o ”Manual para docentes e outros agentes educativos” que contém informações de como reconhecer os sinais que os alunos poderão mostrar quando estão a ter problemas, aprender formas de apoiar alunos e de lidar com os comportamentos problemáticos na escola, oferecer apoio e informação acerca dos recursos disponíveis para os pais, etc.
De destacar, ainda, que este seminário contou também com a participação do Procurador Jubilado Rui do Carmo da EARHVD – Equipa de Análise Retrospetiva de Homicídio em Violência Doméstica, da Procuradora da República Margarida Pereira Silva do Ministério Público de Família e Menores de Cascais, do Procurador da República Hélder Cordeiro do DIAP de Cascais e de Branca Corrêa da Ordem dos Advogados.
Participaram, igualmente, o Intendente Reinaldo dos Santos da Polícia de Segurança Publica e o Capitão Filipe Paulino da Guarda Nacional Republicana.